As Mulheres

Assunto delicado e sensível,
propício para um mais gabarolas,
amante da mentira, do incrível,
que punha no papel ideias tolas.

Não posso aqui contar toda a verdade
nem isso esperais vós certamente.
Mas sentem-se ou ponham-se à vontade,
há muito para ler daqui para a frente.

- - - - - - - - - - II - - - - - - - - -

Tive muitas mulheres na minha vida.
Separei em capítulos diversos.
A primeira foi minha Mãe querida,
sem ela não haviam estes versos.

Umas foram amigas ou amantes.
A todas estimei conforme pude,
com mais ou menos gestos cativantes,
nem sempre, mas às vezes amiúde.

Algumas dão-me só sua Amizade,
eu mais não peço, sinto muito apreço.
Só posso agradecer com humildade
por elas entenderem que mereço.

Algumas são amadas à distância,
que nem sequer sentiram minha graça.
Fui cego por um brilho ou fragrância,
o mesmo com que a luz atrai a traça.

Girei à volta delas tal navio
guiado pela chama de um farol,
suspenso como um corpo no vazio.
A Terra dá assim a volta ao Sol.

- - - - - - - - - - III - - - - - - - - -

Recordo um farol de chama azul,
melhor, são duas chamas lado a lado.
Procure em todo o Mundo, norte a sul
a fonte deste tom tão azulado,

jamais encontrarei olhar igual,
nem seja pelo menos parecido.
Encontro mais depressa o Graal
ou mesmo um tesouro escondido.

São olhos que sorriem bem cientes
da força que lhes vem do interior.
Brilhando, são estrelas e cadentes,
que ao azul do céu roubam a cor.

- - - - - - - - - - IV - - - - - - - - -

Ainda tenho hoje na memória
o primeiro suspiro que soltei.
Instante em que começa esta estória,
porque eu me lembro dele eu não sei.

Descia eu a rua Bonjardim
olhando a mulher à minha frente.
As pernas pareciam não ter fim,
o rabo abanando indolente.

Esbugalhando os olhos eu seguia
a linha da costura, perna acima,
duma meia de vidro luzidia
que ajuda ainda hoje esta rima.

Não sei eu quanto tempo a segui
perdido em assombro, em espanto.
Só sei que nunca mais a esqueci
e prova disso é hoje este meu canto.

Só falta a tudo isto acrescentar:
teria dez anitos mal contados,
andava por ali a passear,
vestia calções curtos, já coçados.

- - - - - - - - - - V - - - - - - - - -

A estória vai fluindo lentamente.
Nunca fui muito burro, nem reguila.
A Vida era uma linha sempre em frente,
era só agarrá-la e segui-la.

E era eu ainda rapazote
sonhava com mulheres mais maduras
que fossem a origem ou o mote
para devassas, lascivas aventuras.

Assim, por elas nunca acontecerem
sofria a bom sofrer, metia pena.
Para vocês melhor me entenderem
vejam o lindo filme da Maléna.

Como o puto do filme eu sofria
ardendo em paixão e em suores,
enchendo a minha vida, o dia a dia,
com muitas amarguras, desamores.

Os seis anos e meio no colégio
são longa travessia no deserto.
Só servem para aumentar o meu desejo
sem uma solução ali por perto.

- - - - - - - - - - VI - - - - - - - - -

Lá chegam os primeiros namoricos
com beijos à socapa e à pressa.
As mãos dentro da roupa em mexericos
bem antes que a mãe lá apareça.

São tempos de aprender, explorar,
querer que duma vez tudo aconteça.
Sentir a boca seca, falta de ar,
turpor que sobe em ondas à cabeça.

Sentir o doce toque dos tecidos.
Com gestos calculados encorrilham
deixando nua a pele e os sentidos
que meus dedos gulosos bem dedilham.

- - - - - - - - - - VII - - - - - - - - -

São desses belos tempos os recortes
que guardo da bonita Adalgiza.
Pequena mas robusta, seios fortes,
que mão sempre que pode ajuíza.

Com um pouco de esforço ainda lembro
dos meus lábios gretados de cieiro.
Não pelo vento frio de Dezembro
nem por qualquer geada de Janeiro.

Era sim a saliva tão docinha
que sua língua húmida oferecia.
Pois, mesmo quando longe eu já vinha,
saudoso a própria boca eu lambia.

- - - - - - - - - - VIII - - - - - - - - -

São sempre pormenores, por mais pequenos,
que fazem desde sempre a diferença.
Dispara o coração sem mais nem menos
tão tonta a cabeça já não pensa.

Às vezes basta um pouco de renda,
a curva de um seio mal tapado,
para que meu coração logo se prenda
e me faça sentir apaixonado.

Para me sentir assim basta um sorriso
de brancos dentes, sãos e bem certinhos.
Os meus olhos cintilam sem juízo
ao verem outros olhos clarinhos.

- - - - - - - - - - IX - - - - - - - - -

Assim me atraiu uma outra amiga
com olhos verdes e louros cabelos.
Esforce-me bem eu, talvez consiga
lembrar o leve toque dos seus pêlos.

Sentindo a minha mão eles se eriçam
subindo ou descendo, perna ou braço.
Mas minhas intenções por aqui ficam
pois mais ela não deixa, marco passo.

- - - - - - - - - - X - - - - - - - - -

Outros casos fugazes eu vivi,
arrasta-me a doida Juventude.
Uma garina aqui, outra ali,
não encontro razão para que mude.

Sucedem-se os apertos e os roços,
festas e bailes ao fim de semana.
Era eu, como tantos outros moços,
domingos no Salão Vasco da Gama.

- - - - - - - - - - XI - - - - - - - - -

No tempo em que os maxi eram moda,
casacos que desciam junto ao chão,
minhas mãos lá por dentro em viva roda,
mexiam que fartava até mais não.

Filhas de boas mães, de gente séria,
deixavam-se ir também neste embalo.
Ao mesmo tempo vi muita miséria.
Bem lá no fundo, nem quero lembrá-lo.

E nas férias, nos parques de campismo,
frágeis tendas abanam, não por vento,
antes sim por algum cataclismo
que rápido acontece lá por dentro.

- - - - - - - - - - XII - - - - - - - - -

Por ser hora de ter algum juízo,
de partir a buscar um bom futuro,
tenho de bem saber o chão que piso
e começar a ser bem mais maduro.

Encontro sem querer, sem estar à espera,
moça linda, um espanto de morena.
É de outro mundo, é de outra esfera,
mas vou tentar, pois vale bem a pena.

De costas, encostada ao namorado,
longos cabelos, pretos e brilhantes,
contrasta com a loira ao meu lado,
essa mesma de quem já falei antes.

Não sei se foi engenho, se foi arte
mas lá fui conseguindo o meu intento.
Despeço-me da loira, ela parte,
algo vai começar neste momento.

Que me deixa confuso e surpreso,
eu que nunca sentira algo assim,
sinto que sem correntes estou preso.
Há alguém importante para mim!

Aviso desde já os curiosos
que não vou escrever os pormenores
dos tempos bem felizes e gostosos,
nem como nos perdemos de amores.

Deixámos, isso sim, um testemunho
que sempre lembrará esta união:
a dois filhos nós demos nosso cunho.
Estão sempre no nosso coração.


- - - - - - - - - - XIII - - - - - - - - -

Apareceram novas aventuras.
Agora eu já era um homem feito
mas, como sempre em busca de ternuras,
fui infiel, não tinha outro jeito.

Não busco aqui qualquer compreensão,
só relato as coisas que vivi. Errei?
Pergunto às vezes à Razão.
Resposta certa ainda não ouvi.

Se por vezes a culpa me invade,
outras vezes não sinto nada disso.
Enquanto eu avanço na idade pergunto:
- Quanto vale um compromisso?

Por momentos para mim nada valia
arrastado em grande turbilhão.
Se eu mais tinha ainda mais queria,
ardendo em quentes brasas de paixão.

- - - - - - - - - - XIV - - - - - - - - -

Larguei o compromisso para trás
liberto para mais, mais tropelias.
Algumas esqueci eu, de tão más,
outras posso lembrar todos os dias

porque elas dão-me força, dão-me alento
em dia menos bom, menos feliz.
Só tenho de encontrar algum momento
bem passado. Agora ele diz:

-Lembras-te daquela ou então desta?
Sentes ainda o cheiro dos cabelos
que teus dedos afagam numa festa?
Agora fecha os olhos. Estás a vê-los?

As imagens, passando em surdina,
como frescos calmantes, podem crer,
libertam em mim todo uma endorfina
que, solta, me relaxa a valer.

Então como na tela de um cinema
sucedem-se as cenas tal e qual.
Ainda vi agora uma pequena.
Boa! Para começar não está mal.

- - - - - - - - - - XV - - - - - - - - -

Pouca idade, um corpo de Lolita
muito bem feito, um rabo empinado,
um mamilo que, firme, arrebita,
o outro desejoso ali ao lado.

Tinha umas coxas cor de alabastro
como colunas fortes de um templo.
No meu céu ela gira como um astro
brilhante, um ponto só no firmamento.

Esta estória é só curta metragem,
culpa dela, bem mais ajuizada.
Mas que fica como um marco na viagem,
memória para sempre bem guardada.

- - - - - - - - - - XVI - - - - - - - - -

Houve estórias que nem um filme deram,
não passaram de vãos documentários.
Houve outras que já se esconderam
por terem conteúdos ordinários.

Outras que não passaram para o papel,
as mulheres que nunca aconteceram.
Eu, tal qual um Van Gogh sem pincel,
fiquei em intenções que esmoreceram.

Vou lembrando os casos efectivos,
aqueles de que faço hoje relato,
foram ardentes e muito emotivos,
merecem ser tratados com bom tacto.

- - - - - - - - - - XVII - - - - - - - - -

Segue o filme ao longe no écran.
Lá estou eu o artista principal
às voltas com um belo soutien.
Raio de ganchos! Abrem sempre mal!

De quem será o peito revelado
por gesto firme, forte, meio brusco?
Enche-me as mãos, estou maravilhado.
A luta continua ao lusco-fusco.

Duma gata selvagem que arranha
as minhas costas tensas, arqueadas,
e sua boca, ávida, abocanha
sem pudor, minhas partes delicadas.

Eu faço o mesmo, não me custa nada.
Isto é tão bom, gozamos outra vez,
e a luz que atravessa a persiana
faz-me então descobrir sua nudez.

Seu corpo lindo está todo às riscas
num misto de claro e escuro.
As gotas de suor teimam, ariscas
em brotar como água de um furo.

Seu peito sobe e desce em sobressalto,
tenta recuperar a compostura.
Já em mim o meu ego está alto
mas o corpo na beira da ruptura.

Não tenho muito tempo de espera.
Alguns parcos minutos? Bem, talvez.
Esta miúda é mesmo uma fera
já quer começar tudo outra vez.

- - - - - - - - - - XVIII - - - - - - - - -

Confundem-se as ideias mais claras,
querendo cada uma vir à frente.
Misturam-se os corpos e as caras,
vou ver se esta caneta não vos mente.

Será sem querer e sempre sem propósito
se isso porventura acontecer.
Tenho de procurar no meu depósito
que está desarrumado podem crer.

Remexo bem no fundo das lembranças
à procura de coisas interessantes.
Não quero aborrecer-vos com merdanças
pois gostam é de estórias de bacantes.

- - - - - - - - - - XIX - - - - - - - - -

É tempo de comboio viajar,
apanhem desde já esta boleia.
Lugar não é preciso reservar,
é só ler as ideias em cadeia.

Na primeira viagem à Suíça,
princípios da década de oitenta,
eu sou simples rapaz vindo da missa
directo para o diabo que me tenta.

Enredos que eu só vira no cinema,
estórias com um nome triplo xxx,
estão ao meu alcance, grande cena!
Se me deixei levar, foi porque quis.

A sujeita é forte e não consigo
tratar dela sozinho, estou toldado.
Vale oportuna ajuda de um amigo
que, vejo, está deitado ao nosso lado.

Como dois camaradas, irmãmente,
levamos a bom termo a empreitada
com parcimónia, muito lentamente.
Depressa! Grita ela excitada.

Difícil acordar no outro dia
depois de tamanha cambalhota.
Perguntei: (mas o outro só se ria)
- Que faz aqui o frasco da compota?

Agora de regresso em Irun,
onde tenho seis horas de espera,
acendo um cigarro, é mais um.
Aqui qualquer pessoa desespera.

Sentado num banquinho da estação,
lugar triste, vazio e sombrio,
reparo em duas moças que estão
num vivo e saudável corrupio.

Lufada de ar fresco, original,
agita desde logo os meus sentidos.
Olá! Olá! Eu sou de Portugal!
Hello! We are from Estados Unidos!

Passeiam pela Europa, estão em férias.
Seu próximo destino é Lisboa.
Primeiro conversámos coisas sérias
mas depois a risada é muito boa.

Tão boa que o comboio já partiu,
nem dei fé de entrar na carruagem.
Não mais as largarei, pois já se viu
preciso companhia para a viagem.

Há uma mais bonita que a outra,
nela concentro toda a atenção.
Ela também dá bola, e não é pouca,
tenho que aproveitar a ocasião.

Por sorte a sua amiga não resiste
ao tum tum do comboio e adormece.
Silvério abre os olhos, nunca viste
o que esta americana te oferece.

Uma mão que gentil pega na minha
levando-a para dentro da blusa.
Oh! Céus, que belo peito ela tinha
que pôs minha cabeça tão confusa.

Passámos toda a noite acordados.
Sabemos que a manhã vai separar
ao meio o comboio para dois lados.
Só nos resta saber aproveitar.

Assim no outro dia são debalde
as forças que fazemos como um laço.
Estamos na estação de Mangualde
e aqui se desfez o forte abraço.

- - - - - - - - - - XX - - - - - - - - -

Passados poucos anos, em Paris
espero, já na Gare de Lyon,
que o meu comboio entre nos carris.
Arrasto as valises pelo chão.

Estou a regressar das Alemanhas,
quero dizer da Feira de Munique.
Já tenho uma noitada nas entranhas,
se não descanso já dá-me um xelique.

Procuro achar espaço para a bagagem
no meio das malas dos emigrantes.
Enchem por completo a carruagem,
devia ter entrado um pouco antes.

Mas lá me consegui acomodar
entre os cinco companheiros de couchette.
É pena o cheiro que anda ali no ar,
se calhar por ser perto da retrete.

Vai ser uma viagem para esquecer,
se isto não mudar radicalmente.
Cansado estou quase a adormecer
não fosse esta vizinha à minha frente.

Ela tem o sotaque de Viseu
que nem anos em França apagaram.
Mas que bela moçoila!-penso eu
assim que nossos olhos se encontraram.

Todo o ar de criada de servir,
corpo rijo por anos de trabalho
num convento, diz ela a sorrir,
enquanto avalia o que valho.

Vou fumar um cigarro ao corredor
e aproveito o ar de uma janela.
- Ufa! Lá dentro está muito calor!
assim diz, ao meu lado, a voz dela.

Conta então, numa lábia dispersa,
no convento só trabalha e labuta.
Comenta um ouvinte da conversa:
- Ou esta é muito santa, ou muito puta!

Pensei para mim, com os meus botões:
- És bem capaz de ter toda a razão.
Não preciso de outras opiniões,
eu mesmo vou tirar conclusão.

Nem preciso fazer grande ginástica
para conseguir levá-la ao castigo.
Ela tem uma forma bem fantástica
de remexer cintura e umbigo.

Corremos os dois para a casa de banho,
daquelas do comboio, estão a ver?
Um metro por um metro é o tamanho,
agora o mais difícil é mexer.

Mas o comboio vai aos solavancos.
Sentada ela está no lavatório
e eu só vejo luzes, ouço cantos,
caminho para o céu, sem purgatório.

Afinal eu ainda me recordo
da noite no comboio Wagon Lit.
A “freira” nunca mais me viu mais gordo.
Quanto a mim também nunca mais a vi!

- - - - - - - - - - XXI - - - - - - - - -

Vou levar-vos agora de avião,
apertem bem os cintos e o medo.
Senti ainda agora um abanão,
borrei-me todo, não guardo segredo.

Já estou do outro lado do Atlântico:
Tijuca, Leblon, Copacabana.
Aqui tudo é beleza, é um cântico,
para mim é tudo jóia e bacana.

O meu irmão mais novo era malandro,
não admira, tinha a quem sair,
mandou uma morena do camandro
como presente para eu curtir.

O sangue corre célere nas veias.
No taxi, a caminho do motel,
procuro ir ordenando as ideias.
Não quero fazer mal o meu papel.

Nós não tivemos grandes problemas
em encaixar os gestos e os gemidos.
Qualquer que seja a forma como gemas
em todo o Mundo os “ai” são parecidos.

Já perto do orgasmo atingir
tento avisar nas formas que eu sei:
-Ó filha estou quase, estou-me a vir!
-Tá gózando? Então gózi, eu já gozei!

De tão singela forma um contributo
para enriquecer o meu vocabulário.
Ela também não entendia puto,
aumentei-lhe uma folha ao dicionário.

- - - - - - - - - - XXII - - - - - - - - -

Sereia que mergulha na piscina,
um corpo bem moreno, escultural.
A cara tão bonita, ainda por cima,
sorriso muito fora do normal.

Em Leça, foi aqui que a eu vi,
senti o forte impacto da paixão.
Assim só poucas vezes eu senti
a força que me impele sem razão.

Por sorte, quis juntar-nos o Destino
alguns dias depois bem junto ao mar.
Pedi-lhe inocente, qual menino,
se guarda a minha roupa, vou surfar.

Palavra puxa acção, há outro encontro
marcado para a próxima semana.
São fortes sentimentos que defronto,
não quero ser malandro que engana.

Deitados já na areia, lado a lado,
trocando umas ideias em conversa,
o meu primeiro beijo foi roubado.
Ronronei como fosse um gato persa.

Surpreso, ainda meio abananado,
agi para devolver tudo a dobrar.
A beijos já estou habituado,
ternura é mais difícil encontrar.

Mas devolvi-a toda inteirinha,
juntei paixão e gestos bem sinceros.
Queria que ela fosse toda minha,
tratá-la com o máximo de esmeros.

Passámos alguns dias fabulosos.
Sentia-me um Tarzan, da Selva o Rei.
Bem via os olhares invejosos
por todo o lado onde a levei.

Conversa sempre fácil, bem disposta,
cereja que faz falta em qualquer bolo.
Fiquei algumas vezes sem resposta.
Pudera! Qualquer um ficava tolo.

Easy come, easy go, diz o ditado.
Rendi-me à cega força do Destino,
partimos cada qual para seu lado.
Acho que já casou, tem um menino.

- - - - - - - - - - XXIII - - - - - - - - -

Mulher feita, madura e vivida,
os homens ela espanta onde passa.
Alguns com atitude comedida,
já outros com piadas mas sem graça.

Imune a tudo isto ela ignora
apelos que lhe caem no regaço.
Só pedem nem que seja uma hora,
a todos diz que não sem embaraço.

Também meu queixo cai tonto de espanto
ao ver corpo fogoso e ardente.
A Lola assim crescida faço o canto
no meu jeito gentil e tão carente.

Um anjo protector, ela me acolhe
em seu peito bem farto, em seu regaço.
Espreito para ver que ninguém olhe,
devolvo-lhe o carinho num abraço,

num beijo, num aperto, num balance
que vai ganhando força atrevida.
Aquilo que parecia um romance
agora é paixão desinibida.

Ficamos enroscados no desejo,
num forte apetite tão voraz,
que hoje à distância se a vejo
pergunto: - Como fui eu tão capaz?

É mais uma estória de ternura
que enche um buraco desta vida.
Por mais que seja árdua, seja dura
merece mesmo assim ser bem vivida.

- - - - - - - - - - XXIV - - - - - - - - -

Depois de uma noite mal dormida,
por entre as almofadas do sofá,
pergunta ela, já meio esquecida,
porque passou, tão só, noite tão má.

Deitado ali ao lado eu dormito
em cama confortável e rendada,
achando, também eu, meio esquisito
a noite que tão longa não deu nada.

Mas foi a timidez ou então medo
dum não que sua boca me dissesse
depois de lhe contar um meu segredo.
Seria muito mau se o não fizesse.

Mas eis que ela avança, decidida,
para dentro dos lençóis que se levantam,
disposta a cobrar noite perdida
e gestos de ternura que lhe faltam.

Fechei os olhos, solto de emoções,
abri o coração e minha mente
a doces e tão leves sensações
que invadem meu repouso de repente.

Os corpos mal se tocam no início.
Estranham e vacilam hesitantes
perante o que parece um precipício
que vai sorvê-los dentro de instantes.

A força do desejo nos empurra,
em breve estamos doidos, desvairados.
É luta corpo a corpo, é uma surra
que damos um ao outro apaixonados.

O tempo apressa as voltas dos ponteiros
e faz que tudo acabe de repente.
Estamos ofegantes mas inteiros.
Sorriso satisfeito que não mente!

- - - - - - - - - - XXV - - - - - - - - -

Houve alguém que pediu com insistência
para não ficar no meio destas linhas.
Não aceitei, por isso paciência,
menina, estas memórias são as minhas.

Prometo ser o mais breve possível,
só duas ou três quadras bem discretas.
Eu sei como o assunto é sensível
e quanto afiadas são as setas

que podem me atingir se porventura
disser alguma coisa mais berrante.
Estamos hoje juntos. Que aventura
levamos dia a dia por diante!

Confesso que, de todos, este foi,
sem dúvida nenhuma, o maior
romance que no tempo se constrói,
num misto de audácia e amor.

Romance que tão doido, sem pudor,
nos faz emaranhar em fina teia
que faria corar o próprio autor
do filme Nove Semanas e Meia.

Nesta folha lhe rendo homenagem
por me fazer feliz e mais ainda.
Além de muita força e coragem
já me deu uma filha muito linda.

Eu sei que prometi e vou cumprir
mas muita coisa fica por dizer.
É livro que se fecha antes de abrir,
folhas que só nós dois podemos ler!

- - - - - - - - - - XXVI - - - - - - - - -

Eu sei, neste momento alguns pensam
que isto são apenas bagatelas.
Sorrisos de escárnio não dispensam.
Eu acho que mais eles do que elas.

Qualquer um mais estórias teria!
Para mim, eu também acho, reconheço,
até o padre lá da freguesia
teve mais sorte! Eu tive a que mereço.

Há só um argumento em meu abono,
por isso tomem nota, tomem tento:
- Não quero eu a ninguém tirar o sono.
Aqui só vos contei uns dez por cento.

Penso que este capítulo já vai largo,
será talvez a hora de parar.
Tenho outros ainda a meu cargo,
já se torna difícil eu rimar.

Assim eu aproveito e evito
que a boca faça alguma inconfidência.
Se tal acontecesse, estava frito,
iria provocar a concorrência.

Mais vale guardar sempre os meus segredos,
fechá-los num baú, perder a chave.
Evitam-se assim sustos e medos
e desta forma os nomes ninguém sabe!

Concordo com o poeta que escreveu
sucesso do Sinatra, sim do Frank.
Estão-me sob a pele, penso eu,
por isso é tão difícil que as arranque.

Como doença grave que consome
a força que preciso para viver,
não sinto qualquer dor, nem sinto fome.
Antes sinto que estou a renascer.

É sempre um milagre que renova
minha capacidade de amar.
Enquanto uma se vai, vem outra nova
seara que está pronta a ceifar.

Algumas eu agarro com mais força.
Um náufrago, nas ondas do mar vivo,
preciso de uma bóia que não torça,
me tenha, em seu abraço, um cativo.

Seguro por um simples sorriso,
palavra ou um gesto de amizade.
De grandes sacrifícios não preciso,
só quero simples nadas com verdade.

Há muitas que não fazem nem ideia
de como são capazes de encher
de vida e ás vezes, volta e meia,
amor, dias que passam a correr.

Pudesse eu mudar, eu mudaria
as mais básicas leis do Universo.
Em mundos paralelos viveria,
saltando de um para outro com um verso.

Teria mil romances, um por dia,
ciúme não seria um contratempo.
Mudando eu de mundo poderia
amar muitas mulheres ao mesmo tempo!